domingo, 31 de julho de 2011

Quinta estação













Mãe
Eu sempre soube
que és a quinta estação
Soma de todas as outras e bem sei
que sou semente de inverno
desta imensidão de mim mesmo

Agarrado todas as manhãs
em teu seio-Terra-divina
sinto-me tão seguro em teu colo

Solo fértil, seiva quente,
deleite sob chuva valente
Crio minhas raízes
Nutro-me de tua parte
e nos olhamos felizes

Mãe
Quando na primavera
eu estiver pronto, não esqueça
Desfie as nuvens pra mim
Deixe que o Sol apareça
Aqueça-me para que eu renasça
e então floresça enfim
Serei tua eterna criança
durante todo o verão
Todos verão

Nutra-me de esperança
mesmo que no outono
as árvores dispam-se aos poucos
de seus mantos bege,
cobrindo-te e preparando-te
para aquecê-la no próximo inverno
Então, me embale para dormir

Hibernarei silente
em sono profundo
por um instante
em ansiosa espera
mas em teu colo novamente
Até a próxima primavera

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Dá-me tua mão













Quero a mão que afaga a nuca
e no meu peito nu o calor que acalma

A face empinada à espera do beijo
da palma que abrasa os poros da estrada

-- olhos fechando... --

Vem, me toca
Evapora estas águas que vertem salgadas
e desaguam na boca, insalubres, amargas

Barragem rompida, miragem perdida
Coragem vencida à luz da razão
Raios do chão rasgando o ar, lucidez na visão

Vem, adoça o silêncio que veste minha alma
e me resgate pra vida!

quinta-feira, 21 de julho de 2011

BrIsa bela










Brisa que passou
tocando o meu rosto
Abraço de mormaço
Aqueceu-me o coração
em seu manto de Sol
Senti-me verão

Por um instante
sorri absorto, tanto
mas, não mais presente
e pronto, o pranto
Agora fico em silêncio
estático, gélido ártico

Sou mar que não ondula mais
numa praia rara e deserta
onde só marejam os olhos
nesta busca morna e salgada
de derreter esta falta
que ela me faz
E eu tento tanto e nada
é capaz de trazê-la de volta

sábado, 16 de julho de 2011

Eclipse









Cedeu-me seus lábios...
Então olhei fixo pra cima
em busca de seus olhos
Estavam fechados e trêmulos

Sufocado por um instante
senti o gosto daquele desejo rosado
tapar-me a boca ofegante
e calar minha língua intrometida

De joelhos lambuzei-me
feito uma criança gulosa
saboreando um sorvete
de néctar orquídea-selvagem

Cedeu-me poros, pele, pelos...
Inteiros, rendemo-nos aos apelos
seguidores de estrelas fartas
do céu de mel, de vinho e paixão

Cedi meu ar rarefeito em excesso
doei-lhe a Vida que em mim é farta
Insensato que sou verti três Sóis
e nu e cru clamei por razão

Mas já era tarde; dois corpos atados
jorravam pelos meios o melhor de nós
meu Sol, sua Lua, uma só poesia
Eclipse sem fim, sem pudor, extasia...

(Daniel H. M. de Carvalho & Lena Ferreira)

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Se fores embora









Se tu fores
Serei vaso vazio
Raso e frio
Sem flores

Ouvirei
Ecos de saudade
No escuro

Sem a tua presença de luz
Aguardaria apenas
O fim de todas as tardes
No banco daquela praça
Onde planejamos a vida
Vendo o Sol esmaecer de sono

Daria atenção às folhas
Sentadas ao meu lado
E contaria tantos segredos,
Alegrias, anseios, sonhos e medos
Permeados em nossas almas
(ah... sorrio quando lembro)
Até calar-me enfim
Com a visita da primavera

Decerto
Hei de encontrar-te por aí
Passeando, tocando e cheirando
Flores tantas...
Como aquelas que um dia colhemos

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Olhos farsantes











Nenhum véu esconde a verdade
Que orbita os teus olhos
E se não tens hombridade
Cuidado com o vento que sopro

Minha dignidade é vendaval
Meu coração é moinho
De sangue impuro, fervente
Vinho que se bebe quente
Cortante feito um punhal

Ouças o que falo
Não pise no calo
Maldito, funesto
Insisto, irrito-me
E tenho dito!